domingo, 23 de novembro de 2025

Seminário Nacional da RENAFRO celebra 22 Anos de Luta


Ancestralidade e resistência com debate empoderador sobre envelhecimento na perspectiva da matriz africana

Por Ògan Assogbá Luiz Alves/PROJETO ONÍBODÊ

Na Universidade de Brasília UNB, o sagrado respira alto. Entre tambores entoados com reverência, e saudações em língua yorùbá, o Seminário Nacional em Comemoração aos 22 anos da Rede Nacional de Religiões Afro-Brasileiras e Saúde RENAFRO abriu seus trabalhos com força, sabedoria e urgência. Sob o tema: Envelhecer — Direitos Humanos e Saúde na Perspectiva da Matriz Africana, o evento não apenas celebra duas décadas de atuação incansável, mas convoca uma reflexão profunda e necessária sobre um tema historicamente silenciado nas políticas públicas e até dentro das próprias comunidades religiosas: o lugar do idoso no terreiro, na cidade e na memória coletiva do povo de axé.

Fundada em 2003 pelo visionário Ògã Pai Marmo, a RENAFRO nasceu como resposta à lacuna estrutural na atenção à saúde das comunidades de matrizes africanas. À frente de um movimento que hoje se estende por todos os estados brasileiros, Pai Marmo antecipou necessidades que só seriam reconhecidas anos depois — como o direito ao cuidado integral, à alimentação digna e à prevenção das DSTs em contextos ritualísticos e comunitários. Durante a pandemia, por exemplo, a RENAFRO se tornou referência Nacional e Internacional ao articular campanhas de segurança alimentar em terreiros, terreiros de umbanda, casas de candomblé, pontos de jurema e outros espaços sagrados, provando que resistência também se faz com panelas cheias e corpos protegidos.

A mesa de abertura do seminário Presidida por Mãe Nilce, contou com a presença marcante da Ministra dos Direitos Humanos Macaé Evaristo, que reforçou o compromisso do governo federal com a valorização dos saberes ancestrais e com a implementação de políticas antirracistas e interseccionais. “Envelhecer com dignidade é um direito. Envelhecer como preto, como mulher preta, como sacerdote ou sacerdotisa afro-brasileira é um ato de resistência que demanda reconhecimento institucional e proteção estatal”, afirmou a ministra, arrancando aplausos emocionados da plateia formada por mães e pais de santo, ogãs, ekedis, babalorixás, ialorixás, líderes comunitários e pesquisadores.

A atual gestora nacional da RENAFRO, Mãe Nilce, conduziu a cerimônia com a firmeza de quem carrega nas costas décadas de luta coletiva. Em seu discurso, destacou que o envelhecimento dentro das religiões de matriz africana não pode ser visto apenas como declínio, mas como processo de acumulação de axé, de sabedoria ritual, de liderança espiritual e de guardiã de memórias vivas. “Nossos anciãos são bibliotecas em movimento. Quando um velho de axé parte, levamos décadas para recompor o que se perde. Por isso, cuidar deles é zelar pela própria continuidade da tradição”, disse, voz embargada e olhos cheios de propósito.

Um dos momentos mais simbólicos do seminário foi a apresentação oficial dos Jovens de Axé da RENAFRO, coletivo formado por novas lideranças religiosas, estudantes, ativistas e artistas engajados na continuidade do legado da rede. . “os jovens são a ponte entre o passado que nos ensina e o futuro que construímos. 

Além de hoje o seminário seguirá amanhã ao longo do dia com mesas temáticas que abordam desde o direito à saúde integral para os mais velhos até o combate à violência espiritual e institucional contra terreiros liderados por anciãos. Estudos recentes apontam que mais de 60 por cento dos terreiros no Brasil são conduzidos por pessoas acima dos 60 anos — muitas delas sem acesso regular à saúde, enfrentando solidão, abandono familiar ou pressão por sucessão religiosa precoce. Diante disso, a RENAFRO traz para o evento a importancia do Cuidar do Envelhecimento e principalmente buscar políticas públicas para quem a sociedade costuma esquecer e até abandonar.


Terça, 25 de novembro, a energia do seminário convergirá para as ruas. Às 9 horas, centenas de mulheres negras, vestidas em seu Axé, avançarão rumo à Esplanada dos Ministérios na Marcha das Mulheres Negras, ato histórico que reivindica justiça, memória, saúde e o direito das mulheres e também de envelhecermos com soberania espiritual e corporal. A RENAFRO estará na linha de frente, junto com outras organizações do movimento negro, carregando não só bandeiras, mas búzios, atabaques e todo NOSSO SAGRADO e a certeza de que cada passo dado é também um ato de fé e de futuro.

Vinte e dois anos depois, a RENAFRO prova que saúde é também ritual, que direitos humanos são invocações coletivas e que envelhecer também é um ato de sabedoria, no terreiro, pode ser  e deve ser  um ato de plenitude, reverência e poder. Axé não se apaga. Axé se multiplica. E enquanto houver quem saiba rezar, quem saiba cuidar e quem saiba lembrar, o povo de axé seguirá erguendo, curando e resistindo  com os pés na terra e os olhos nas estrelas.

Axé para todos os tempos.

Que os Orixás nos iluminem – e nos lembrem sempre que a força do nosso povo está na união. 

Axé!

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