quarta-feira, 22 de outubro de 2025

Memórias da Resistência: A Luta das Comunidades Afro-Religiosas em Brasília e o Gesto que Ecoou no Congresso Nacional


Por: Ògan Assogbá Luiz Alves/PROJETO ONÍBODÊ


Em meio à arquitetura monumental de Brasília — símbolo de poder e centralidade política —, há uma história menos celebrada, mas profundamente marcante: a da resistência das comunidades afro-religiosas. Uma dessas memórias, emblemática e carregada de simbolismo, é o protesto silencioso ocorrido no Plenário Ulysses Guimarães da Câmara dos Deputados, quando fiéis de religiões de matriz africana viraram as costas em sinal de repúdio ao então deputado e bispo da Igreja Universal do Reino de Deus, Rodrigues. O gesto, simples e contundente, foi uma resposta direta aos ataques sistemáticos promovidos por setores evangélicos contra terreiros, pais e mães de santo, e toda a espiritualidade afro-brasileira.

Esse momento não foi isolado. Faz parte de um longo histórico de lutas por reconhecimento, respeito e direitos — lutas que atravessam séculos de apagamento, estigmatização e violência simbólica e física. Ainda assim, há marcos de resistência que iluminam esse caminho. Um deles ocorreu em 20 de março de 2003, quando, por iniciativa do deputado Luiz Alberto (PT/BA), o Congresso Nacional realizou uma sessão solene em homenagem às Religiões de Matriz Africana — um feito histórico, já que, até então, jamais o Legislativo havia prestado tal reconhecimento a tradições que, desde os porões dos navios negreiros, mantiveram viva a memória ancestral de milhões de brasileiros.

Religiões de Matriz Africana: Pilares da Cultura Brasileira

Candomblé, Umbanda, Tambor de Mina, Xangô, Batuque — essas tradições não são apenas expressões religiosas. São espaços de preservação linguística, histórica e identitária. São quilombos contemporâneos, como bem define Ògan Assogbá Luiz Alves em sua fala: locais onde se fala o yorubá, se entoa o atabaque, se resgata o nome dos Orixás, Voduns e N'Kisses e onde a ancestralidade negra é celebrada como fonte de força e dignidade.

No entanto, apesar de sua contribuição inegável para a formação da cultura brasileira — da culinária à música, da medicina popular à filosofia —, essas religiões continuam sendo alvo de preconceito, intolerância e violência. O discurso de “democracia racial”, tão propagado no imaginário nacional, esconde uma realidade cruel: a de um país que, mesmo após mais de um século anos da abolição da escravidão, ainda trata o que é negro como inferior, marginal ou demoníaco.

Zumbi, Herói Tardio, e a Luta por Visibilidade

A demora em reconhecer Zumbi dos Palmares como herói nacional — só incluído na Galeria dos Heróis do Panteão da Pátria em 2011, mais de 300 anos após sua morte — é sintomática. Enquanto isso, figuras como Domingos Jorge Velho, o bandeirante responsável por destruir o Quilombo dos Palmares, permanecem nos livros didáticos como “heróis da ordem”. Esse desequilíbrio revela como a narrativa oficial ainda é construída sob uma lógica de apagamento da resistência negra.

É nesse contexto que o Movimento Negro, desde a década de 1970, com a fundação do Movimento Negro Unificado (MNU), passou a ocupar espaços antes vedados. A luta por cotas raciais nas universidades, por exemplo, não é apenas uma questão de acesso à educação — é um ato de justiça histórica. E, como bem questiona o ativista, por que incomoda tanto ver um jovem negro em uma sala de aula universitária, enquanto a maioria permanece à margem da sociedade?

O Racismo Inconsciente e as Perguntas que Precisamos Fazer

Quantos médicos negros atendem nos hospitais? Quantos professores negros ensinam nossos filhos? Quem comanda os noticiários, as novelas, os programas infantis? A ausência de representatividade não é acidental. É estrutural. E é exatamente por isso que iniciativas como a sessão solene de 2003, ou o simples ato de virar as costas em protesto no Congresso, são atos de desobediência simbólica — formas de dizer: “Nós existimos. Nossa fé é legítima. Nossa história não será apagada.”

Por um Brasil que Respeite Todas as Formas de Fé

Hoje, em 2025, as comunidades afro-religiosas de Brasília seguem firmes em sua missão: manter viva a chama da ancestralidade, enfrentar o racismo religioso e educar para a diversidade. Cada terreiro é um ato de resistência. Cada oferenda, um gesto de memória. Cada atabaque, um grito de liberdade.






E enquanto houver quem use a tribuna do Congresso para espalhar ódio disfarçado de fé, haverá também quem, com dignidade e coragem, vire as costas — não por desrespeito, mas por autoafirmação.

Abaixo a discriminação racial, social, de gênero e religiosa.
Um mundo melhor é possível — e ele começa quando respeitamos todas as formas de existir.

Que os Orixás nos iluminem – e nos lembrem sempre que a força do nosso povo está na união. 

Axé!

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